O que é a degustação horizontal?

As degustações estruturadas são experiências que proporcionam muito mais que o prazer de tomar nossa bebida favorita. Elas são…

degustação horizontal

As degustações estruturadas são experiências que proporcionam muito mais que o prazer de tomar nossa bebida favorita. Elas são também uma ferramenta de aprendizado para quem quer conhecer mais sobre o mundo dos vinhos e suas nuances. Desde encontros com pessoas queridas até eventos organizados profissionalmente, toda ocasião de prova de rótulos pode se beneficiar de alguns “modelos” de comparação. Eles ajudam a entender melhor as diferenças práticas entre vinhos distintos, quando os degustamos lado a lado. Uma das maneiras mais ricas de saber mais nesse aspecto é, justamente, a degustação horizontal.

Mas afinal, o que é uma degustação horizontal?

O nome deste modelo comparativo remete à ideia de que os vinhos comparados são postos “lado a lado” por meio de algum elemento em comum, como por exemolo safra, uva, estilo etc. Porém, observando uma ou mais variáveis que sejam diferentes, como os produtores, regiões ou vinificação. E como isso funciona na prática? Temos alguns exemplos de modelos adotados nestes casos, para que você entenda melhor:

Mesma safra, mesmo produtor, diferentes uvas

Permite avaliar as expressões das diferentes uvas que um produtor utiliza em um dado ano e região vinícola.  Sendo da mesma safra e local, sabemos que as condições climáticas e de colheita também foram iguais entre todos os rótulos. Dessa forma, é possível ter uma ideia bastante clara da tipicidade de cada variedade de uva (como já mencionamos neste outro artigo sobre vinhos tintos). Ainda, conseguimos entender a maneira como se manifestam em eventuais vinhos de assemblage (ou blends), por exemplo.

Mesma uva, diferentes países

Mostra com clareza como as diferenças geográficas, climáticas e de estilo dos produtores ao redor do mundo faz uma mesma variedade de uva se comportar de maneiras extremamente distintas entre si. Ficam evidentes as nuances do processo de produção de vinhos. Degustações com vinhos varietais de Pinot Noir da França, EUA e Chile, ou então de vinhos Sauvignon Blanc de produção na França, Nova Zelândia e Chile, apenas como exemplos, irão mostrar diferenças importantes de estilo “na taça” (como chamamos o momento de degustar) que mostram como pode-se trabalhar a mesma uva de maneiras distintas para gerar novos resultados.

Mesma uva, mesma região, vários produtores

Talvez a mais sofisticada, em termos de paladar, entre os exemplos que estamos dando aqui. É um passo além do caso acima, pois irá mostrar diferenças sutis de estilo entre produtores ou microrregiões, ou entre processos distintos de vinificação. 

Por exemplo, vinhos Syrah da Serra da Mantiqueira, no Brasil, oferecerão rótulos com e sem passagem por barricas, de produtores de diferentes partes da Serra em SP, MG e RJ. Isso vai mostrar, na sua taça, como cada vinícola trabalha o vinho e, ainda, como a região pode influenciar em seus rótulos. Pode estender-se para 2 ou 3 uvas típicas da região para ser ainda mais delineado o perfil dos produtores.

Cada caso desses permite a quem participa aprofundar seu conhecimento no mundo dos vinhos. Degustando assim fica mais fácil entender, de maneira prática, as diferenças entre os pontos que comparamos. Contudo, existem outras “modalidades” de degustação que oferecem visões diferentes dessas, sendo que a “vertical” é das mais famosas.

As diferenças entre degustação horizontal e vertical

Recorremos de novo ao que o nome remete: neste caso, seria uma lista de anos. Isso vem do fato de, na degustação vertical, provarmos várias safras distintas de um mesmo vinho, para assim acompanharmos a evolução do vinho ao longo dos anos. Isso mostra as influências climáticas e de manejo a cada ano de produção do vinho, bem como a maturação do vinho na garrafa com o passar do tempo, principalmente de vinhos muito estruturados e com grande potencial de evolução.

Enquanto na degustação horizontal o mais comum é comparar as diferenças que causam as variáveis “externas” a cada vinho (outras uvas, outros produtores, outras regiões etc), na degustação vertical o foco recai no efeito do tempo sobre um único vinho e na consistência de seu produtor. Muitas vezes chamada apenas de “vertical”, essa comparação mostra distinções geralmente mais sutis que ocorrem entre as safras. Ainda, ela dá uma ideia do ponto ótimo de abertura e consumo de um vinho de guarda.

Exemplo de uma degustação vertical clássica

Pensando em uma degustação de um grande Brunello di Montalcino, por exemplo, agora em 2024. Este é um tipo de vinho para ter abertura geralmente a partir de 8-10 anos da data da safra. Portanto, incluiremos safras que representem a evolução do vinho de acordo com isso. 

Então, podemos incluir amostras de safras como 2016 (8 anos de safra), 2015, 2014, 2013 e outras mais antigas que estejam disponíveis. Essa lista poderia chegar até a um exemplar 2004 ou ainda mais antigo, já que em alguns casos esses vinhos permitem guarda por 20 anos ou até mais, mantendo sua qualidade de evolução. Isso dará uma boa visão de como o Brunello se comporta ao longo do seu tempo de guarda.

Quando fazer uma degustação horizontal e uma degustação vertical? 

Como vimos, a degustação vertical promove a percepção sobre a evolução de um único vinho. Sem diversas safras disponíveis no evento, fica difícil oferecer uma boa amostragem para esse objetivo. Por exemplo, uma degustação com apenas 3 anos para prova pouco vai acrescentar nessa busca. 

Ainda existe a questão de safras antigas de um vinho nem sempre serem fáceis de conseguir no mercado. Portanto, a vertical acaba sendo um modelo mais restrito. Ela acaba acontecendo em ocasiões especiais pelos próprios produtores ou grandes colecionadores, que podem oferecer uma quantidade de garrafas de anos diversos com maior facilidade. Mas sempre são uma ocasião ímpar para quem pode participar.

Em contrapartida, as degustações horizontais são mais versáteis. Elas, muitas vezes, são com vinhos da safra disponíveis no mercado na ocasião, facilitando assim o planejamento e preparação do evento. Ocorrem em momentos como encontros entre amigos e reuniões de confrarias, bem como em eventos educativos e grandes avaliações de mercado. Vale destacar que, ao planejar uma ocasião dessas, além das condições adequadas para degustação, é importante que os vinhos tenham similaridade suficiente entre si para ser possível perceber as diferenças que queremos avaliar.

Degustações às cegas

Esse formato, que é mais aplicado no modelo horizontal de degustação, esconde os rótulos dos participantes até depois de terem sido provados. Revela-se os vinhos apenas ao final da degustação prática, geralmente divulgando mais detalhes sobre cada um. 

É uma experiência interessante e muitas vezes divertida e forma impressões o mais neutras possível sobre cada vinho. Como não temos a influência de saber, por exemplo, que é um produto famoso e caro ou vice-versa, podemos ampliar os conhecimentos com menos preconceitos. É comum ainda que as pessoas avaliem com notas durante as provas, compiladas ao final e compartilhadas junto com a revelação dos rótulos. A prática quebra muitos paradigmas e, ocasionalmente, algumas amizades, quando as opiniões são muito fortes! 

O impacto de uma degustação de vinhos no mercado mundial

O caso de degustação às cegas mais famoso foi o “Julgamento de Paris”. O evento foi promovido em 1976, pelo britânico radicado em Paris Steven Spurrier (1941-2021). 

Dono de uma pequena loja de vinhos e escola de degustação, sua intenção original era chamar a atenção para seu negócio, ou seja, vender mais vinhos e conquistar novos alunos. 

Ele provou e se interessou por uma nova geração de vinhos dos EUA naquele momento, quando uma amiga levara algumas caixas depois de uma viagem. Então, organizou uma degustação às cegas, comparando vinhos brancos e tintos da França e dos EUA. Jornalistas e importantes figuras francesas do mundo do vinho, receberam convites para dar visibilidade à ocasião. 

A maioria dos convidados declinou, considerando que “vinhos americanos“ não eram dignos de tomar seu tempo. Ainda, como os rótulos franceses eram de regiões famosas e tradicionais, julgaram não apresentar novidades.

Foram 8 os franceses e francesas experts em vinhos que, afinal, aceitaram o convite e avaliaram os vinhos. E, portanto, foram os franceses que colocaram os americanos em primeiro lugar nas notas, causando um rebuliço. Isso fez com que os EUA se tornassem produtores de destaque mundial, criando ainda um enorme mercado interno para vinhos, até então com foco em whisky e cerveja. Até hoje a maior parte da produção americana de vinhos tem consumo no próprio país, mas há casos de grande sucesso vendidos para fora. Entre eles está o fruto de uma parceria entre franceses e americanos, o ícone Opus One, um rótulo de renome e qualidade indiscutível.

O episódio foi tão sério que gerou uma crise para Spurrier, chegando a ser banido de algumas vinícolas francesas, acusado de “sabotar” os produtores do país. Tudo isso porque os jurados franceses não sabiam que estavam elogiando vinhos americanos e destacando defeitos dos compatriotas. 

Dicas para planejar uma degustação horizontal

A intenção não é ser uma lista exaustiva, mas se você tiver interesse em promover uma degustação, fique de olho nos pontos a seguir. Seja uma reunião entre amigos para estimular o aprendizado sobre o assunto, ou simplesmente criar uma experiência divertida e educativa para um encontro da sua turma, você poderá aplicar todos eles:

Escolha um tema

Uva, região, produtor, safra etc. Dessa forma você irá “enquadrar” melhor a experiência e observar de modo mais prático as diferenças entre os vinhos.

Pense no público

Um evento pago com jantar harmonizando é diferente de um encontro de amigos em casa. Também leve em conta o nível de gastos que a turma que você pretende reunir pode ter com a experiência. Lembre-se de que há público para todos os perfis de degustação. Isso irá ditar outros passos do processo.

Selecione os vinhos

Você pode escolher todos os rótulos e compartilhar os custos com as demais pessoas. Pode oferecer por conta própria se for muito generoso(a) ou, ainda, definir que cada um leve um vinho diferente dentro da sua lista e planejamento. Neste caso, ainda pode ser às cegas, já que cada um só saberá qual é o seu vinho. Só fique de olho para respeitar o orçamento com base no público, qualquer que seja o caso!

Escolha o local e acompanhamentos

Seja num restaurante com menu fechado ou na casa de alguém com petiscos, é importante pensar no ambiente apropriado para a turma e os vinhos escolhidos. Escolha comidas que harmonizem bem com os rótulos e ofereça bastante água, assim como taças boas e sempre iguais para todos.

Defina a ordem

A sequência da degustação dos vinhos pode influenciar na percepção de cada um. Comece com os mais leves, seguindo então progressivamente para os mais encorpados e complexos.

Promova a participação

A interação entre os participantes é o ponto mais rico de uma degustação estruturada, ajudando todos a aprenderem mais e trocarem impressões. Promova as anotações de percepções que também podem servir como referência futura para cada um. Se possível, conte com alguém especialista para enriquecer e conduzir a experiência, pode fazer muita diferença no aproveitamento.

Em resumo, degustações estruturadas são uma grande oportunidade

Como vimos, nessas ocasiões é possível perceber com maior clareza as nuances entre diferentes vinhos (no caso da degustação horizontal) ou safras (no caso da degustação vertical). Dessa forma, permite-se um grande aprendizado para quem tem interesse em evoluir sua parte técnica ou apenas conhecer mais sobre o mundo desta bebida que adoramos, em geral. 

Uma das maiores vantagens de participar de (ou promover) uma degustação é a possibilidade de todos provarem uma amostra grande de vinhos, sem precisar investir em uma garrafa para cada um. Isso porque todos compartilham apenas algumas doses de cada garrafa. Assim, você “avança” seu conhecimento mais rapidamente dentro de um único evento. 

Essas experiências permitem explorar uma diversidade de estilos e terroirs ao mesmo tempo e podem ser tão acessíveis quanto você e seus colegas queiram que seja. Que tal agora organizar sua própria degustação horizontal e descobrir as nuances que cada vinho pode revelar?

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